Comentado por: Dr. André da Silva Santos, oncologista COIP, IPP, IAM.
Novo estudo revela que o lactato, uma molécula produzida durante o exercício intenso, desempenha um papel fundamental na formação de células cancerosas.
Pesquisadores médicos estão na busca de desenvolver uma compreensão abrangente do mecanismo que causa o processo em que as células se tornam cancerosas. Este processo é conhecido como oncogênese. Uma das vias desse processo em estudos recentes é conhecida como lactato, uma molécula geradas em meio ao exercício intenso. O objetivo desta pesquisa é explicar o papel do lactato na criação de células cancerosas. As últimas descobertas do estudo foram publicadas na revista Carcinogenesis.
Sobre o lactato
O lactato é o subproduto da glicólise, um processo químico que se separa em componentes moleculares menores com o objetivo final de gerar energia. O lactato acumula-se no sangue e nos tecidos quando se envolve em atividade física intensa. Se o lactato suficiente acumular, isso pode causar menor desempenho físico, bem como um desconforto muscular.
Um famoso cientista alemão chamado Otto Warburg percebeu que as células cancerosas consumiam uma abundância de glicose em comparação com as células normais. Conhecido como o efeito Warburg, esse fenômeno é uma referência ao fato de que as células cancerosas prosseguem através de mais glicólise e geram mais lactato do que as células normais. Fato este, pela necessidade de mitoses descontroladas destas células cancerígenas, pois o único substrato que supre o núcleo para mitose é a glicose.
A última pesquisa
Nova pesquisa sobre este assunto foi encabeçada pelo diretor do departamento de desempenho esportivo e laboratório de fisiologia da University of Colorado-Boulder Sports Medicine and Performance Center. O diretor, Inigo San Millan, estava determinado a descobrir porque o efeito de Warburg ocorre. A pesquisa do câncer passou do metabolismo celular para a genética desde o apogeu de Warburg no início do século XX. No entanto, as pesquisas mais recentes podem mudar o destaque para o papel do lactato no contexto do desenvolvimento do câncer.
Lactato e oncogênese
A equipe de pesquisa de San Millan sugere que o lactato é o único composto metabólico necessário e envolvido em quase meia dúzia de estágios decorrentes da carcinogênese. Seu estudo analisou o papel do lactato no processo pelo qual os novos vasos sanguíneos se desenvolvem dentro dos tumores. O termo médico para este processo é a angiogênese. O estudo também examinou o papel do lactato na fuga imune. Este termo refere-se às células cancerosas que eludem as respostas imunes naturais do corpo humano. Também aprofunda o papel do lactato na migração celular, metabolismo auto-suficiente e metástase. Todo esse processo associa-se ao ambiente ácido com alteração do Ph e consecutivamente acionamento das metaloproteinases (enzimas envolvidas no processo de metástase tumoral).
O artigo de San Millan detalha como o lactato auxilia na criação de um microambiente ácido fora da célula cancerosa durante a metástase. Esse fenômeno desencadeia a disseminação de células cancerosas adicionais. O estudo também explora a conexão entre componentes genéticos e lactato. A equipe de pesquisa levantou a hipótese de que três fatores de transcrição (p53, cMYC e HIF-1) comuns na maioria dos cânceres catalisam a desregulamentação do lactato.
Podemos parar com o excesso de lactato no câncer
O papel importante do lactato na formação de células cancerosas ajuda a explicar por que as pessoas que se exercitam regularmente tem um risco baixo de desenvolver câncer. Os indivíduos que se exercitam (sem excessos) desfrutam de um corpo que é treinado para transferir lactato a uma fonte de energia do corpo, evitando um acumulo excessivo do composto metabólico. Os achados permitem a especulação de que um estilo de vida ocioso combinado com um consumo excessivo de açúcar pode levar a uma abundância de lactato que alimentará o câncer. Esses achados mostram que o lactato não é apenas presente quando o câncer se desenvolve, mas é necessário para cada etapa do seu desenvolvimento.
Próximo passo
San Millan espera juntar-se com o Hospital da Universidade do Colorado para analisar os efeitos de programas fitness personalizados sob medida criados para pacientes com câncer.
Com isso, novos medicamentos poderão ser desenvolvidos, esses medicamentos provavelmente ajudarão os principais transportadores de monocarboxilato que transmitem lactato entre as células do corpo.
One thought on “O papel do lactato na formação de células cancerosas”
Também considero que o estudo de Inigo San Millan e George A. Brooks representa um grande avanço na pesquisa sobre o câncer. Aliás, mencionei sobre essa minha opinião em artigo recente (originalmente publicado em inglês) Nosso artigo é intitulado: “O estresse como o Fator Indutivo para o aumento da produção de lactato: o caminho evolutivo para a carcinogênese”. Positive Health Online, Edição 241, Outubro, 2017 em http://www.positivehealth.com/article/cancer/stress-inductive-factor-for-increased-lactate-production-evolutionary-path-to-carcinogenesis
Sumário
No presente artigo é discutido sobre a evolução recente na compreensão do papel da formação de lactato na promoção do câncer. Nele postula-se a hipótese de que o estresse crônico é o principal fator de risco e indutor do aumento da produção de lactato que pode levar ao processo cancerígeno. Também explica como o estresse desenvolve a formação de lactato, o que foi descoberto em 1925.
A hipótese atual suporta dietas cetogênicas para prevenção e terapia do câncer. Isto dentro do raciocínio de que, enquanto as gorduras não têm efeitos apreciáveis no sistema nervoso simpático (SNS) ou na formação de lactato, dietas ricas em carboidratos têm efeitos significativos no SNS e na formação de lactato.
No final desse artigo, há uma breve explicação e link para o artigo paralelo onde são discutidos os glicosídeos cardíacos (ex: digitálicos – digoxina, etc) como os medicamentos fundamentais para prevenção e tratamento do câncer.